MPSC fortalece combate ao crime organizado com foco em criptoativos e lavagem de dinheiro durante workshop

Evento reuniu especialistas e Promotores de Justiça de São Paulo e Rio de Janeiro para compartilhar estratégias de investigação, rastreamento e apreensão de ativos virtuais usados por organizações criminosas. 

03.10.2025 18:49
Publicado em : 
03/10/25 09:49

Aperfeiçoar o conhecimento para ampliar a apreensão e a recuperação de criptoativos e de ativos virtuais vinculados a atividades ilícitas, com foco no combate às organizações criminosas, foi o objetivo central de um workshop promovido nesta sexta-feira (3/10) pelo Ministério Público de Santa Catarina (MPSC). O evento, realizado na Procuradoria-Geral de Justiça, em Florianópolis, reuniu membros, servidores e integrantes de grupos especializados, de forma presencial e on-line.

Durante a programação, dois Promotores de Justiça com atuação destacada em investigações complexas compartilharam experiências teóricas e práticas. Do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), Fabiano Gonçalves Cossermelli Oliveira apresentou estratégias de investigação, rastreamento e apreensão de criptoativos, com demonstrações práticas em plataformas de ativos virtuais e exchanges de criptomoedas. Sua abordagem detalhou como essas tecnologias podem ser utilizadas tanto para a ocultação patrimonial quanto para a recuperação de valores ilícitos.  

Já o Promotor de Justiça do Ministério Público de São Paulo (MPSP) Paulo Carolis trouxe os bastidores da Operação Carbono Oculto, que revelou um esquema bilionário de lavagem de dinheiro por meio de fintechs, postos de combustíveis e fundos de investimento, com forte atuação contra uma facção criminosa. Durante sua explanação, Carolis destacou os desafios logísticos e investigativos enfrentados na maior ação já realizada contra o crime organizado na economia formal brasileira.  

O evento foi promovido pelo Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas (GAECO), pelo Grupo Especial Anticorrupção (GEAC), pelo Grupo Estadual de Apoio ao Enfrentamento a Facções Criminosa (GEFAC) e pelo Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional (CEAF).

O Coordenador Estadual do GAECO, Promotor de Justiça Wilson Paulo Mendonça Neto, avaliou o evento como uma grande oportunidade de aperfeiçoamento aos que se interessam por conhecimento no universo dos criptoativos e acabam tendo uma participação ativa em busca de resultados concretos para a sociedade.

"São temas relevantes, com diversos casos que nós temos enfrentado, e é importante destacar aqui a presença maciça dos nossos policiais civis, delegados de polícia, agentes e escrivães de polícia, nossos servidores e assistentes, policiais militares, policiais penais. É justamente essa atuação conjunta e integrada que nos deixa mais forte no enfrentamento da criminalidade organizada", declarou.

O Coordenador Estadual do GEAC, Promotor de Justiça Cléber Lodetti de Oliveira, enfatizou que "esse tipo de aperfeiçoamento traz ferramentas que vêm agregar bastante à atividade do Ministério Público e à própria efetividade do que se busca em um processo".

Já a Coordenadora do GEFAC, Promotora de Justiça Juliana Degraf Mendes, observou que o Ministério Público precisa “acompanhar as mudanças sociais e econômicas porque elas impactaram, sem dúvida na atuação ministerial".

O Promotor de Justiça Marco Aurélio Morosini, que está à frente do CEAF, disse que o "evento trata de um tema bastante importante e desafiador para o Ministério Público diante dessas novas realidades das organizações criminosas".  

Desafios da persecução penal com criptoativos

Pela manhã, o Promotor de Justiça do MPRJ Fabiano Gonçalves Cossermelli Oliveira ministrou a palestra "Persecução penal com criptoativos: investigação, rastreamento e apreensão". À tarde, demonstrou de forma prática o que havia exposto no turno inverso.

Com ampla experiência na área, Cossermelli atuou por dez anos no GAECO/MPRJ, foi Subcoordenador do Núcleo de Combate à Corrupção e participa de grupos de trabalho sobre criptoativos no Departamento de Justiça dos Estados Unidos e no Conselho Nacional do Ministério Público. Ele enfatizou o propósito da informação, de transformar conhecimento técnico em ações concretas de investigação, recuperação de ativos e responsabilização penal, fortalecendo a atuação institucional diante dos desafios impostos pela tecnologia.

A exposição contou com a interação entre os participantes e trouxe uma perspectiva atualizada sobre o universo dos ativos virtuais e sua crescente utilização em práticas ilícitas. Desde o surgimento do Bitcoin, em 2008, os criptoativos evoluíram em escala e complexidade, movimentando, em 2024, cerca de US$ 29,2 trilhões. "O meu propósito é prático: saber como esse conhecimento se converte em operação, investigação, recuperação de ativos, prisão. Esse é o nosso objetivo quando se faz uma investigação criminal", afirmou logo no começo.

Cossermelli apresentou os principais conceitos técnicos da área, como blockchains (redes descentralizadas), VASPs (empresas que operam no mercado de criptoativos), wallets (dispositivos de armazenamento de chaves privadas), além de novas tendências (stablecoins, smart contracts e tokenização, por exemplo). Também abordou o panorama da regulamentação nacional e internacional, destacando os avanços e os desafios ainda em discussão no Brasil e no mundo.

A palestra evidenciou que os criptoativos não representam apenas um problema de investigação criminal. Segundo o Promotor de Justiça do MPRJ, o impacto alcança também diversas áreas de atuação do Ministério Público, como família, empresarial, cível e execução fiscal, exigindo uma abordagem multidisciplinar e integrada. Entre os principais crimes associados aos criptoativos foram destacados estelionatos, furtos eletrônicos, lavagem de dinheiro, pirâmides financeiras, ransomware (software malicioso) e até crimes graves como a comercialização de material de pedofilia.

Força-tarefa Carbono Oculto

A tarde teve início com uma conversa com o Promotor de Justiça do MPSP Paulo Carolis, que, ao detalhar os bastidores da Operação Carbono Oculto, considerada a maior ofensiva já realizada contra o crime organizado na economia formal brasileira, falou sobre a importância da articulação entre todas as instituições envolvidas.

A ação acarretou mais de 1.400 pontos de busca e exigiu uma complexa articulação entre diversas instituições, como o Ministério Público, a Receita Federal, a Secretaria da Fazenda, a Polícia Federal e a Polícia Civil, em um modelo interagência que se tornou referência.

Carolis explicou que a operação foi estruturada a partir da identificação de esquemas de lavagem de dinheiro que envolviam postos de combustíveis, fintechs, fundos de investimento e usinas de etanol, todos conectados por uma rede de empresas de fachada e contas opacas, e destacou os desafios logísticos e judiciais enfrentados, como a negativa inicial de cautelares, que exigiu atuação direta junto ao Tribunal de Justiça para garantir a deflagração.  

"O nosso desafio hoje é como transformar esse material em algo mais aprofundado. A lição que ficou foi a necessidade de ajustes normativos e de preservar a atividade econômica. Não podemos impactar empresas de forma irreversível; temos que ser cirúrgicos, ir apenas aonde precisamos. Assim, a atividade se autorregula e continua funcionando", afirmou.

Além disso, Carolis ressaltou a importância da atuação integrada: "Não se descobre a trama do alto escalão com interceptação telefônica. São tramas econômicas, complexas, que só aparecem com grande esforço investigativo e integração institucional. O crime organizado evoluiu, e nós precisamos evoluir junto", disse.

Aprovado por quem participou

Do Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público do Pará (MPPA), o Promotor de Justiça Danyllo Maués Pompeu Colares destacou que o conhecimento adquirido no evento contribuirá para o desenvolvimento de um método de trabalho mais eficaz no combate ao crime organizado.

“Nós, do Gaeco do Pará, ainda estamos iniciando a especialização sobre esse tema. Este é o primeiro workshop de que temos conhecimento, organizado por uma Procuradoria-Geral de Justiça. Portanto, agregar conhecimentos, ter contato com o tema e, posteriormente, poder atuar em favor da sociedade para recuperar esses ativos é de suma importância”, afirmou.

O Promotor de Justiça Edisson de Melo Menezes acredita que a capacitação é fundamental para a estruturação da Instituição e das forças-tarefa que atuam diretamente no combate às organizações criminosas. “Especialmente neste modelo de lavagem de dinheiro e recuperação de ativos. O Estado, o Gaeco e o Gefac têm a missão de buscar inteligência e conhecimento para recuperar esse patrimônio, que precisa ser revertido em favor da sociedade brasileira.”

Já o Promotor de Justiça Gabriel Cavalett entende que a instrução recebida na capacitação desta sexta-feira representa um ganho para a atuação funcional. “Os ativos virtuais, hoje, não estão apenas ligados ao crime organizado, mas também à criminalidade relacionada a estelionatos e extorsões, o que acaba impactando a atuação do MP. Para que ocorra uma persecução patrimonial efetiva, será necessário também aprimorar e aperfeiçoar nossos conhecimentos”, comentou.

Por fim, para a Promotora de Justiça Isis Pereira Mendes, com a expansão do uso de ativos virtuais, muitos desafios serão enfrentados em diferentes áreas de atuação do MP. “Essa divisão do curso, aliando a parte teórica, pela manhã, à parte prática, à tarde, é de suma importância para que possamos ter um contato prévio dentro da Instituição e adquirir uma noção de como serão realizadas as atividades, de modo que a eventual recuperação dos ativos seja efetivamente protegida e revertida em favor da sociedade”, concluiu.

Fonte: 
Coordenadoria de Comunicação Social do MPSC